quarta-feira, 27 de junho de 2012

O julgamento de Frinéia e a beleza no júri

Li, já faz algum tempo, uma pesquisa inglesa constatando que as pessoas bonitas tem mais chances de serem absolvidas no júri. Talvez por isso os advogados dizem aos seus clientes, até instintivamente, antes do julgamento: "Faz a barba, corta o cabelo, cobre essa tatuagem de dragão, veste uma blusa melhor, uma calça boa, um sapato legal, e se não tem, pede para tua família providenciar". 

E quem duvida dessa pesquisa, conto uma história. Viveu na Grécia, no século IV a.C, uma das mais lindas mulheres que já existiu. De corpo escultural, perfeito, Frinéia, a deusa sensual, era cortesã; para ela afluíam homens sedentos de prazer; destruía lares, alucinava jovens, corrompia os costumes da época; sua beleza e erotismo constrangiam os bons costumes da vida ateniense, e por isso foi levada ao Areópago. O povo lotou o tribunal, e com sentimentos contraditórios de admiração e de ira pressiova pela condenação de Frinéia. Hipérides, seu advogado, vendo que o falso moralismo a condenaria, teve um insight genial, que tocou em algum ponto bem fundo da alma humana, rasgou as vestes da linda mulher diante da multidão, que de olhos arregalados e hipnotizados pelo belo contemplavam a formosura divinal de Frinéia. E por unanimidade de votos Frinéia foi absolvida. 

Mas quem conta poeticamente essa absolvição é o poeta Olavo Bilac: 

"Pasmam subitamente os juízes deslumbrados
Leões, pelo calmo olhar de um domador, curvados
Nua e branca, de pé, patente à luz do dia
Todo o corpo ideal de Frinéia reluzia
Diante da multidão atônita e surpresa
No triunfo imortal da carne e da beleza". 

Um comentário:

Virgiani disse...

Gostei de seu texto.
Interessante também a abordagem do Carlos Heitos Cony, no domingo passado, sobre a Frineia e o Marcos Valério...
Sds,
Virgiani Kremer
juridico@hce.com.br





São Paulo, domingo, 19 de agosto de 2012

Carlos Heitor Cony

O julgamento de Frineia

RIO DE JANEIRO - Dentro de escassas oportunidades, venho acompanhando o julgamento do mensalão no Supremo Tribunal Federal.

Impossível (e inútil) ouvir todos os debates, de qualquer forma, acho que há exagero no tempo e nas palavras dos respeitáveis ministros. Reconheço que a linguagem e os detalhes são peculiares à prática da Justiça, mas acho que a tecnologia pode abreviar as sentenças e pareceres sem perda do conteúdo processual.

Na Roma antiga e na Grécia, em alguns tribunais, o imperador ou os juízes (no caso da Grécia central) condenavam ou absolviam os réus de maneira mais simples: levantavam a mão direita e colocavam o polegar para baixo: era a condenação à morte. Se o polegar estivesse para cima, era a absolvição. Em ambos os casos, a justiça seria feita.

Ficou famoso o caso de Frineia, cuja formosura despertou paixões e ciúmes. Acusada por um pretendente desprezado de explorar o próprio corpo, foi levada a um júri de cidadãos ilibados. No momento da sentença, os juízes botaram o polegar para baixo. Era a condenação fatal. Olavo Bilac tem um poema dedicado ao julgamento de Frineia: segundo o poeta, ela despiu os véus que a cobriam e surgiu toda nua, "no triunfo imortal da Carne e da Beleza".

Diante daquela monumental escultura, um a um os polegares dos juízes foram subindo, subindo, sendo provável que também subissem outras partes dos respeitáveis membros do júri.

Não estou sugerindo um retorno à Antiguidade clássica. Mas um parecer ou voto de 70 laudas, que exige cinco horas para ser lido, podia ser condensado num único polegar, quer dizer, em 11 polegares para baixo ou para cima.

Desde que o Marcos Valério não se obrigasse a ficar nu em plenário para ser absolvido.

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