sexta-feira, 28 de outubro de 2016

A maior das glórias

"Que os deuses te deem tudo o que o teu coração deseja: uma família e um lar em harmonia com crianças brincando felizes. Não há no mundo dádiva maior nem mais bela, duas mentes e dois corações que pulsam como um só. De todas as glórias, esta é a melhor".

(Homero, in Odisseia)

De que material são feitos os firmes sonhos?

Quando um homem traça um objetivo a ser conquistado, e oposições e obstáculos de toda ordem se levantam contra ele, isso é apenas um teste para ver de que material é feito os seus sonhos.

A lógica e o domínio de si

Um líder, um orador, um professor, um intelectual, não podem ser pessoas que afrontam a ciência da lógica, sob pena de perderem a credibilidade. 

Aristóteles dizia que o mais importante princípio da lógica é o princípio da não- contradição. Contradição é sinônimo de confusão e de incoerência. Um orador não pode ter uma comunicação contraditória, como também não pode haver contradição entre o que ele pensa e fala, entre o que ele fala e faz. 

Quanto mais o homem domina a si mesmo mais lógico ele se torna. A falta de lógica em uma mensagem no fundo é uma falta de domínio dos pensamentos, das paixões e das atitudes. Lógica é a ciência do pensar, falar, sentir e agir corretamente - que se desenvolve a partir de outra ciência: o domínio de si mesmo.

Estão chegando os novos helenistas


Por que a Grécia Antiga é essencial hoje? A Grécia é um poderoso e belo referencial teórico, é um ponto de partida valioso para a elaboração intelectual. 

Dizia Arquimedes: "Dê-me uma alavanca e um ponto de apoio que eu moverei o mundo". A Grécia continua sendo essa alavanca e esse ponto de apoio capaz de mover o mundo do direito, da política, da oratória, da liderança, da ciência; capaz de fazer movimentar para frente a roda do progresso em todos os campos do saber humano. 

Assim como o renascimento da cultura grega tirou o mundo da estagnação medieval, assim, novamente, ela renascerá, com novas cores, com novos brilhos, com novos matizes, com nova modernidade para conduzir a humanidade a patamares mais avançados de civilização.

 Navegando no Mar de Vinho, livro do historiador Thomas Cahill, é um livro culto, inspirador, instigante, que aponta para a essencialidade da Grécia Antiga para o mundo atual. Em curso, a nova renascença! Em ação, os novos helenistas!

Pregar aos olhos e aos ouvidos

Padre Antonio Vieira, o Paiaçu, o 'grande pai', como os índios o chamavam, foi um dos grandes oradores sacros da humanidade; viveu no Brasil no século XVII. 

Dizia, em seu imortal Sermão da Sexagésima: "Sabem, padres pregadores, por que pouco abalo causam os nossos sermões? Porque não pregamos aos olhos, pregamos só aos ouvidos. Por que convertia o Batista tantos pecadores? Porque assim como as suas palavras pregavam aos ouvidos, o seu exemplo pregava aos olhos". 

Todo candidato a orador deveria ler o Sermão da Sexagésima.

Os limites do meu mundo

"Os limites de minha linguagem significam os limites do meu mundo", dizia o filósofo Wittgenstein. 

Por isso devemos nos capacitar para vermos o mundo com mais amplidão. A linguagem se amplia e se aperfeiçoa com leitura, com meditação, com novos conhecimentos, com novas experiências, com a nossa evolução moral, intelectual e espiritual. 

O estudo da oratória é uma das maiores ferramentas para expandirmos nossa linguagem e vermos o mundo com mais totalidade.

Quis chegar e cheguei!

Ele era apenas um garoto correndo pelas ruas da ágora grega quando a cena de um julgamento lhe chamou a atenção. No tribunal, sob os aplausos da multidão, Calístrato orava, convencendo os jurados com sua grandiloquente defesa. O povo vibrava e gritava o nome de Calístrato, saudando-o e levando-o nos braços como um herói. A cena foi deslumbrante, e o garoto invejou e ambicionou a glória de Calístrato. 

Quando cresceu, aquele menino abriu um processo contra as pessoas que tinham usurpado a sua herança. Mas seu desempenho foi fraco; perdeu o processo e foi vaiado pelos atenienses. Mas não baixou a cabeça, mas não perdeu a autoestima. Recolheu-se em rigorosa ascese. Para curar a gagueira, falava com seixos na boca. Para fortalecer a voz, declamava os versos imortais de Homero e Hesíodo, que eram ouvidos mesmo com as revoltosas ondas do mar chocando-se nas brutas rochas. Para corrigir um tique nervoso que o fazia levantar ora um ombro ora outro, falava debaixo de duas espadas que dilacerava-os todas as vezes que eles se moviam desordenadamente. Para não cair em tentação de voltar à vida normal e abandonar a sua disciplina, cortou a metade do cabelo, raspou uma sobrancelha e deixou apenas parte do bigode, aparentando uma imagem monstruosa. 

Quando se sentiu preparado, reabriu o processo contra seus usurpadores. O povo foi assistir, lotando o recinto do tribunal. O garoto, agora jovem homem, falou com tanta maestria e poder, que o povo gloriosamente o levou nos braços como fizeram com Calístrato, e a ele, posteriormente, foi dado uma coroa de ouro, e as futuras gerações o aclamaram como o maior orador da antiguidade grega. Disse Demóstenes: "Trabalhei e lutei com perseverança, quis chegar e cheguei".

Prefiro a ditadura do relativismo do que a ditadura do absolutismo

Em 2005, o papa Bento XVI, conceituado doutrinador católico, lamentava porque o mundo estava caminhando para a "ditadura do relativismo". Pareceu-me um certo saudosismo medieval, quando a igreja ditava o que era certo e o que era errado - época em que quase tudo ficou subdesenvolvido no campo da arte, da ciência e do pensamento. 

Falar em "ditadura do relativismo" é uma contradição em seus próprios termos; ditadura existe quando se quer sufocar o relativismo. O relativismo é como a dualidade, é uma lei da natureza; mais do que sufocá-lo, é preciso entendê-lo; não se supera negando-o. Mais verdades foram encontradas em meio às verdade relativas do em meio às verdades absolutas. 

Ambientes de verdades absolutas são lugares tristes, atrasados e obscuros. "O homem é a medida de todas as coisas". Para mim, mais vale a pena pagar o preço de se viver em liberdade à viver sob as sombras dos dogmas, dos fanatismos e do aprisionamento do pensar.

O orgulho mais difícil de vencer

O orgulho mais difícil de vencer parece ser o orgulho do saber. Conta-se que o filósofo Diógenes, aquele que disse para Alexandre, "Saia da frente de meu sol", ao rejeitar suas ofertas de poder e de riqueza, saiu pelas ruas de Atenas, com uma lamparina acesa nas mãos, em plena luz do dia, à procura de um verdadeiro homem. Na sua peregrinação resolveu adentrar aos portões da Academia de Platão, encontrando no ambiente interno da famosa escola lindos e luxuosos tapetes espalhados por todos os lados. Quando Platão o avistou, saudou-o com vivacidade: "Seja bem-vindo, Diógenes. O que o trazes aqui?" Diógenes, olhando para os tapetes sob seus pés, respondeu: "Vim pisar no orgulho de Platão". O que Platão calmamente retrucou: "E como pisas tão orgulhosamente, oh Diógenes!".

O belo na oratória

O bom orador deve desenvolver em si a sensibilidade artística, a capacidade para contemplar e ser um veículo do belo. Sendo o seu próprio talento uma arte, o orador deve abrir-se para captar e banhar-se na estética da pintura, da poesia, da escultura, da arquitetura, da música, do teatro, da dança, fazendo de sua própria arte um pouco de cada uma delas. 

Na pintura ao lado, John William Waterhouse, ilustra uma cena da mitologia grega, onde Hilas, de tão belo que era, foi capturado pelas ninfas. A dimensão do belo deve ser um componente essencial numa oratória clássica. O belo que encanta, o belo que seduz, que é capturado pelo público, o belo que revela, o belo de Deus materializado na verdade dos argumentos e das palavras do orador.

Sucesso é ter iniciativa

Algo simples e real: sem iniciativa não se chega ao sucesso, à nenhuma realização. Pode pensar positivo, sonhar, ter fé, elaborar planos etc. 

Pensamento positivo, sonhar, ter fé, elaborar planos, só ganham imensa importância se o homem partir com firmeza para a ação. Por isso, a iniciativa é uma das leis do triunfo.

Orador hábil no trato

Disse Platão: "A retórica exige do orador um espírito extraordinariamente hábil com os homens". 

Quanto mais hábil no trato com os outros, mais capacidade de persuadir tem o orador. Isso exige diplomacia, espírito esportivo e amistoso, bom humor, arte de conviver, discrição, não levar as coisas para o lado pessoal. 

São muitas as qualidades que se exige para falar com habilidade no trato com os outros. Isso envolve inteligência interpessoal.

Kairós retórico

Jesus foi um grande mestre do kairós retórico. A linguagem para se comunicar com crianças é uma; para falar com jovens é outra; com idosos, outra; com intelectuais, outra; com pessoas sem formação acadêmica, outra. Diferentes são as idades, os lugares, as culturas, as profissões, as ideologias, o tempo. 

Paulo, apóstolo, soube falar com os gregos na linguagem dos gregos. Isso se chama kairós retórico. Kairós é uma palavra grega que significa tempo, ocasião, momento certo. 

Tanto o filósofo Pitágoras quanto o sofista Górgias davam imensa ênfase a essa habilidade do orador. É sinal de ignorância, segundo eles, adotar uma única forma de proferir um discurso para aqueles que estão dispostos de maneiras diferentes. 

Kairós retórico é uma qualidade de quem já alcançou um bom grau de excelência na oratória. Jesus foi um grande mestre do kairós retórico. No círculo íntimo de seus discípulos falava de um jeito; para o povo, falava de outro jeito; para os doutores da lei, fariseus e saduceus ("raça de víboras, hipócritas") outro era o tom do discurso; para as crianças, adaptava-se carinhosamente a elas; para as mulheres, outra era a sua forma de falar.

Encontrar o modo apropriado de falar para cada um, para cada público, isso é kairós retórico, isso é sinal de sabedoria no exercício da arte de falar bem.

Por um ensino de oratória nas escolas

Parece um sonho, talvez seja, mas é um dos meus propósitos ver a Oratória incluída como disciplina nos currículos escolares brasileiros. 

Na história da educação mundial, um dia ela já fez parte, como nobre saber, desde a Grécia Antiga, passando por Roma e por grande parte da cultura medieval e do Renascimento. Segundo Isócrates, "a oratória é a filosofia aplicada na arte de bem falar, na arte do bem escrever e na arte do bem viver.

Por meio da educação retórica podemos tornar o homem bom, sábio e capaz de servir à pólis". Por si só, essa definição do grande educador grego já demonstra sua essencialidade na formação política, cultural, moral, intelectual e espiritual do cidadão.

O poder do silêncio na Grécia Antiga

Na mitologia grega, - e nesse caso com forte sincretismo com a mitologia egípcia - Harpócrates era o deus do silêncio, e era representado por uma criança sentada em cima de uma flor de lótus, com uma das mãos em prece e a outra levada à boca pedindo silêncio. 

O que há de tão valioso no silêncio interior? Calma, pureza, criatividade, virtude, discernimento, sabedoria, alegria, oratória, filosofia, afeto, razão ciência, inspiração artística, consciência, positividade, rejuvenescimento. O silêncio é um grande professor.

Síntese e expansão retórica

Perguntado certa vez qual o principal talento que o orador deveria possuir, Zenão de Cítio, o fundador do estoicismo, respondeu com um gesto: fechou e abriu a mão. 

A mão fechada significava a capacidade do orador de sintetizar qualquer assunto, trazendo-o para um centro dialético unificador de teses - o uno. 

E a mão aberta significava a capacidade do orador de expandir qualquer assunto em todas as direções - o múltiplo. 

Um talento tão grande assim, implica existência anterior de muitos outros talentos.

A nossa melhor tradução

"Nossa melhor tradução se dá, indiscutivelmente, pela palavra", diz Roberto Magalhães, autor do livro A Arte da Oratória: Técnicas para Falar Bem em Público. 

E continua: "É pela palavra que nos apresentamos. Falando ou escrevendo, mostramos quem somos. Não é o rosto bonito, nem a roupa de grife que nos revelam. Falando ou escrevendo, escancaramos o que temos de bom ou de ruim. Explicitamos as limitações do nosso raciocínio ou o brilho de nossa inteligência, a visão preconceituosa ou a respeitosa atitude assumida no trato com as diferenças individuais. É pela linguagem que nos definimos. No exato momento em que começamos a falar, começamos a nos despir de todas as mentiras. É pela linguagem que entregamos ao outro nossa melhor tradução. Feliz ou infelizmente são poucos os bons leitores".

Quanto mais culto, mais fácil a oratória

Foram obras desta magnitude que encontrei pelo caminho, e que fizeram parte de minha construção como advogado do tribunal do júri. 

Diz Vitorino Prata Castelo Branco, em seu premiado livro O Advogado e a Defesa Oral, que "quanto mais culto é o advogado mais fácil lhe é a oratória".

 Este é um dever ético dos mais relevantes do advogado: capacitar-se intelectualmente. Fazer pouco caso disso é ser a cada dia menos advogado.

Gênios verbais

"Sofista vem do grego 'sofhia', e de fato possuíam eles grandes conhecimentos que procuravam transmitir aos seus discípulos, e nessa transmissão, o veículo principal era a eloquência brilhante dos gregos. Eles amavam a claridade verbal, a riqueza das palavras, a firmeza do estilo, a profundidade do conteúdo, a distinção da atitude e a nobreza do gesto". 

(Vitorino Prata Castelo Branco, em O Advogado e a Defesa Oral)

Erros judiciários

Teve uma época que eu lia muito sobre erro judiciário; muitas vezes, pega-me extremamente emocionado, angustiado, abalado, revoltado. Um erro judiciário é sempre a conjugação, por vezes misteriosa, de muitos fatores. 

A Revista Super Interessante, deste mês de outubro, trata do tema, mostrando vários casos de erros da justiça e apontando suas causas. Para mim, o maior responsável por um erro judiciário, quando acontece, é do julgador, aliás, é dele o poder final de decidir sobre a culpa ou inocência de alguém. Não menosprezo outros fatores, como incompetência da defesa, acusação irresponsável, delegado sem ética, testemunha mentirosa, perícia falsa, opinião pública insana, jornalismo sensacionalista, isso e aquiloutro.

No entanto, é do julgador o poder final. Preguiça, preconceito, automatismo, pouca consciência de sua missão ou mesmo incapacidade de examinar as provas com acuidade, estão entre as debilidades morais e intelectuais do julgador, que o levam a praticar tão grave crime contra o ser humano, que muitas vezes, suas consequências nefastas para a fé na justiça, não se apagam durante muitas gerações.

A iluminista Escola de Atenas

"Antes das regras de retórica é preciso aprender os segredos da filosofia, porque a arte de pensar bem precede a arte do falar bem", dizia o filósofo iluminista D'alembert, coautor, juntamente com Diderot, da famosa e ousada Enciclopédia, obra monumental da inteligência, que visava reunir todo o saber artístico, científico e filosófico acumulado pelo homem ao longo do tempo. 

Os iluministas defendiam a disseminação e a popularização do livro como instrumento racional de ilustração e esclarecimento visando tirar o povo das trevas da ignorância. A iluminista Escola de Atenas tem por método de ensino o desenvolvimento da aprendizagem da arte da oratória por meio da filosofia, fazendo exatamente o que disse D'alembert, ensinando os segredos da filosofia para a arte de falar bem.

Para cada auditório, um jeito diferente de falar

Hoje, na Câmara Criminal, os argumentos da defesa foram aceitos e os desembargadores determinaram a soltura de minha constituinte. 

A oratória forense diante dos juízes togados - mais professoral e acadêmica - é diferente da oratória desenvolvida diante do júri popular - mais grandiloquente e psicológica. 

Essa individualidade de cada auditório - que o orador deve perceber e ter o talento para adaptar seu discurso - os gregos chamavam de kairós retórico.

Cessem por um instante vosso ódio

Certa vez fazia um júri, e na oportunidade contei aos jurados a história do primeiro julgamento do júri que existiu, uma mistura de mitos e fatos, que aconteceu logo após a Guerra de Troia, para julgar Orestes, um jovem que tinha matado a própria mãe, porque esta, juntamente com o seu amante, matou o seu marido, Agamenon, pai de Orestes. 

Os primeiros promotores que existiram não foram promotores, foram promotoras, e se chamavam Fúrias. As Fúrias eram três, e seus nomes eram: Castigo, Vingança e Interminável. A juíza que presidiu o júri, composto de doze honrados cidadãos atenienses, foi Atenas, a deusa da sabedoria. O advogado foi Apolo, o deus da razão. O julgamento, que se deu num lugar chamado Areópago, empatou, e Atenas - Minerva para os romanos - decidiu que a partir dali todo julgamento que desse empate, diante da dúvida, seria decidido em favor do réu, daí surgindo a expressão 'voto de minerva'.

 E concluí, depois de contar a história aos jurados, dizendo: "Ilustres senhores e senhoras do júri, uma acusação não pode ser movida pela fúria, não pode se resumir apenas em castigar o réu, ou ser a justiça uma mera conotação de vingança, a impor penas excessivas e intermináveis contra a figura do homem sentado no banco dos réus, sem ouvir direito suas razões, sem examinar com imparcialidade os fatos, sem ponderar com lógica as provas. E foi isso que Atenas disse para as Fúrias, em determinado momento do júri, impondo ordem no Areópago, pois elas não deixavam o réu falar: 'Cessem por um instante vosso ódio para que possamos ouvir com atenção o que o réu tem a dizer'".

Tenho fé nos que não perderam a fé

Tenho fé na vida.

Tenho fé na razão.

Tenho fé na educação.

Tenho fé nos jovens.

Tenho fé em um novo tempo.

Tenho fé no que virá.

Tenho fé naqueles que não perderam a fé em tudo isso.